Eu era um idiota romântico. Amava, amava, fiel homem escudo de mim mesmo contra o olhar malicioso de mulheres certas, mulheres da vida. Eu era dela. Só. Até que um dia descobri que ela me traía com o Geraldinho, o gerente do escritório em que trabalhava. Foi num dia que ela anunciou chegar tarde. Eu a vi passando no carro dele, aos beijos, parados no sinal. Eu atravessei na faixa do pedestre, como outras dezenas de transeuntes, andava e meus olhos fixados neles. Eram eles.
O amor é uma pedrada na testa. É o verme que insiste em ficar no estômago a estragar-lhe as entranhas. É o leite azedo que você bebe diariamente e gosta, mesmo o sabendo venenoso. É a mordida mais veloz e sagaz, mais voluptuosa e mortal que a das serpentes. É mordida na alma. Deixei de ser fiel naquela noite. O amor não vale a pena ser vivido, Baby, então não se apaixone. Não me apaixono desde aquela noite. Não voltei para casa. Ela não me viu mais. Deve me procurar, me odiar, deve ter chorado, ainda deve chorar. Foi a minha vingança. O silêncio é a pior das respostas para o ser humano. Eu a matei.
Sou Hector García López, sou de mim mesmo. De ninguém mais, mas serei seu essa noite, Gloria. Que nome, que olhos, que pernas, ai, que bunda, que xota, que cabelos, isso, que coxas, abre, isso....
Gloria entrou no banheiro. Eu acendi um cigarro, liguei um rádio, e B.B. King me presenteou com seu blues, enquanto a fumaça subia de minha boca e narinas para perfumar o quarto à meia luz. Gloria é casada. Quer se separar. Lá vem ela de novo, não, Gloria. Tirou a toalha.
Hector, vem morar comigo. Me liga amanhã.
Atendo. Hector, eu te amo. Você não entendeu, Gloria. Não te amo, não me apaixono. Sou um garoto de programa. Suma da minha vida.
Ela pulou nua do oitavo andar, o exame constatou coca em alto nível no sangue. Não deixou bilhete, nem despedida, nem recado com batom no espelho do banheiro como fazia em nossas orgias no motelzinho.
Ah, Gloria. Sua filha da puta. Deixou duas crianças e o corno do marido traído sofrendo. E tudo começou com uma história mentirosa minha. Eu nunca fui fiel. Não tive mulher, não havia Geraldinho. Mas Gloria me amou. É isso que acontece com quem ama.
Gorete saiu do banheiro. Lá vem ela imitando uma odalisca. Não transamos ainda.
Sabe, Gorete, vamos conversar primeiro.
Eu era um idiota romântico. Amava, amava, fiel homem escudo de mim mesmo contra o olhar malicioso de mulheres certas, mulheres da vida. Eu era dela....
Hector García López é ex-barman, ex-motorista de caminhão e ex-garoto de programa. Escreverá a coluna em alternância com o jornalista Leandro Mazzini.